Capítulo 32 - Vivendo o sonho

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Muito tempo passou desde a última vez que aquele telefone encardido tocou, “quem ainda usa telefone fixo hoje em dia?”, ele lembrou que alguma vagabunda tinha dito em alguma noite onde ele não lembra como chegou em casa e nem quem ela era… mas ele lembra da frase, sentia-se velho e sabia que isso não era um problema.

– Quem é, porra?

A estática no telefone velho era tanta que mal dava para distinguir se a voz do outro lado era masculina ou feminina. Mesmo assim, sem rodeios e em meio ao barulho, uma frase se destacou:

– Preciso falar com você. Sabe onde me encontrar.

Depois disso… só ruído.

Hannow não demonstrava emoções sinceras há anos, e não seria ali, sozinho naquele quarto fodido, que ele o faria. Mas, se houvesse alguém por perto, teria percebido que os olhos caídos, com aquela expressão típica de puta no dia seguinte, deram lugar a um semblante que misturava preocupação e euforia.

Muita coisa havia acontecido desde o último relato sobre as atividades de Hannow. De grupos de jovens ocultistas retardados a mortes súbitas generalizadas, ele estava mais parado do que o habitual. Um exorcismo aqui, outro ali. Um demônio para expulsar ou com quem fechar algum acordo. Alguns sacrifícios sem grande relevância. A verdade era que Hannow estava colhendo os frutos de tudo o que havia feito nos seus anos como "ocultista fodão".

Provavelmente, todas as maldições rogadas contra ele apenas arranhavam sua velha lataria. E que lataria de bosta. Qualquer enfermeiro paciente diria que ele deveria se internar. Mas, em vez disso, Hannow preferia fechar bares e gastar dinheiro com vagabundas — e nem tinha certeza se elas eram reais ou apenas súcubos na sua cabeça embriagada.

Ah, e se você está se perguntando: sim, ele ainda fumava compulsivamente seu cigarro mentolado. Não porque era viciado, mas, como ele mesmo dizia:

– Se eu deveria parar de fumar porque isso estraga minha vida, você não deveria nem sair da cama.

Depois de um longo banho em um banheiro que provavelmente causaria doenças de pele em pessoas normais, Hannow deu uma olhada no espelho, mais parecido com um mosaico de tão arrebentado, e murmurou:

– Eu deveria fazer a barba.

Mas a ideia se dissipou, assim como a fumaça do cigarro, que permaneceu ali, firme e forte, junto com a barba.

Com o bom e velho conjunto de calça social surrada, blusão amassado e sapatos que imploravam por graxa há anos, ele estava pronto para encontrar o que quer que fosse do outro lado da linha telefônica. Mas, assim como fazia com a carteira, precisou confirmar que o isqueiro estava no bolso antes de sair.

Talvez fosse a única coisa de valor naquele chiqueiro que ele chamava de casa: uma peça de ouro com detalhes pretos, de um modelo que já nem existia mais.

Enquanto apagava o cigarro em um copo com um dedo de vodca quente, Hannow vasculhou o chão com os olhos em busca do isqueiro. E, acredite, essa tarefa poderia ser bem complicada no meio daquela zona. Mas então, ao fundo, ele viu o brilho do queridinho e levantou-se para pegá-lo.

– Então você estava aí, né, seu filho da puta – disse, brincalhão, como quem fala com um animal de estimação.

No entanto, a expressão logo ficou séria ao perceber que o cabo do telefone estava rasgado, aparentemente por mordidas de rato, e fazia tempo que aquilo tinha acontecido.

Hannow enfiou o isqueiro no bolso do blusão, olhou para o que chamava de espelho e, abrindo a porta para sair, murmurou:

– É… tava demorando pra essa merda toda voltar.

A porta se fechou.

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